24 janeiro 2013

Em Contra Corrente: Desenvolvimento e Cultura

À força de tanto se insistir sobre a vertente dos desequilíbrios financeiros e sobre os progressos e retrocessos da ginástica do sobe e desce dos números, corre-se o risco de esquecer o essencial do debate político – as pessoas e os seus territórios; o melhor aproveitamento dos recursos naturais, humanos, científicos e técnicos de que dispomos, mas que não utilizamos ou utilizamos mal; as feridas sociais que se vão abrindo nos ambientes de trabalho, nas escolas, na administração, na convivência social, no estado social, as quais geram desconfiança, mal-estar, perda de coesão social e risco de conflitualidade agravada.

Esquece-se, perigosamente, a necessidade imperiosa de construir um projecto de desenvolvimento e o modo como ele se deve processar, tendo em conta uma clara definição de objectivos e metas a atingir e o maior envolvimento possível dos diferentes actores sociais e da população em geral.

Reconheço que, nas presentes circunstâncias, se trata de um exercício difícil, porque exige a busca laboriosa de um claro consenso político acerca das suas finalidades prioritárias e das correspondentes linhas de orientação estratégica para as alcançar, num contexto nacional, comunitário e mundial particularmente adverso. Porém, o maior obstáculo é que o País está fracturado por múltiplos interesses: classe social, situação geográfica, idade, desigualdade de rendimento e de oportunidades de emprego, acesso à educação, aos cuidados de saúde, à acessibilidade e aos transportes, etc.

Acresce que se incrustou, na mundividência da geração que detém o poder político (governo e oposição), a miopia do interesse pessoal imediato e hedonista, da saloiice da aparência e da ostentação, a tolerãncia da promiscuidade de interesses entre o público e o privado, o culto do dinheiro e das estatísticas… Quem nos governa não tem um conhecimento próximo da realidade humana e social, não gosta dos seus concidadãos, nem se mostra capaz de assumir como suas as necessidades e as aspirações legítimas do próximo. Há uma espécie de vírus, que atravessa também a comunicação social e, indirectamente, contamina a consciência colectiva.

Há que reconhecer que a crise não assume apenas uma expressão financeira ou económica; é uma crise antropológica, de civilização e de cultura, o que não pode ser subestimado na construção do desenvolvimento.

Assim sendo, a busca de consenso político em torno do desenvolvimento implica que se questionem os modelos de produção e de estilo de vida, a repartição das oportunidades de emprego e a afectação do tempo ao trabalho e ao lazer, a importância dada à convivialidade e às relações sociais, o lugar da liberdade pessoal, da autonomia individual e das comunidades locais.

Em síntese: Para nos entendermos acerca do desenvolvimento que desejamos precisamos de um debate acerca do que fundamenta o humano, o seu sentido de vida e de felicidade, Preciamos de um debate sobre a cultura.

1 comentário:

  1. Pontaria certeiríssima. É por aqui que há que fazer caminho. O resto pode ser muito importante, mas é composto, apenas, por acessórios ou condições instrumentais.

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