Na semana passada, a Bolsa deu que falar, não tanto pelos sobe e desce das acções, mas sobretudo pelo destaque dado na comunicação social ao turbo-administrador e aos elevados montantes das remunerações ou compensações dos administradores (compensações - na maioria das situações até é irónico aplicar este termo, muito usado na terminologia anglo-saxónica).
Deixemos o turbo-administrador e vamos aos montantes. Legais, parece. Mas justificáveis? Peter Drucker (que, certamente, não era um feroz anti-capitalista) aconselhava os gestores a não ultrapassarem, nas suas remunerações, a diferença de 20 para 1 (sendo este o salário médio da empresa). Disse-o em 1984 e voltou a criticar as exageradas disparidades num Forum em Davos há menos de 10 anos, porque, segundo ele, minam a confiança interna necessária à gestão da empresa. É verdade.
Mas a questão não é só essa. É a de que critérios poderão alguma vez justificar uma remuneração média de 450000 euros anuais/37500 mensais (administradores executivos) quando o salário médio em Portugal andará pelos 900 euros mensais (uma média que esconde grandes diferenças), já para não falar dos 485 do salário mínimo.
Segundo um estudo da DECO sobre Corporate Governance e tendo por referência relatório da CMVM sobre 2009, em 25 empresas cotadas a remuneração média dos CEO era de 37 vezes a do salário médio dos trabalhadores das respectivas empresas. Na minha opinião, não há nada que possa justificar de forma eticamente aceitável que remunerações de dirigentes de uma empresa (mesmo no caso ser o dono) possam valer 30 ou 40 vezes o salário médio pago aos seus trabalhadores. Não me venham dizer que na Alemanha ou na Holanda ou na Austrália ou nos EUA as diferenças são maiores tal como na Danone (rácio 214) ou no Banco Santander na Espanha (205) ou na Coca-Cola (470).É certo que a decisão estratégica, em princípio, vale mais que a operacional. Mas 30, 40, 100, 200, 300, 400 vezes mais?! Acho que a única razão é, a ganância, a avidez (ou greed, talvez em inglês não choque tanto).
Alguns argumentam que o desempenho de um CEO é que faz a diferença e, se não fosse ele e a sua alta remuneração, o desempenho da empresa seria negativamente afectado. Isto não está demonstrado empiricamente e há até casos de altos dirigentes muito altamente pagos terem levado empresas a desastres e à falência. Tal pretensa justificação pode mesmo significar que o contributo dos trabalhadores é irrelevante. Só o medo do desemprego ou outros factores de submissão poderão explicar como é que este insulto (porque o é objectivamente!) não suscita a revolta. Mas atenção: a revolta desorganizada é má conselheira.
A OIT, no seu relatório World Work Report 2008, subtitulado Disparidades de Rendimento na Era da Globalização Financeira denuncia com clareza a distância crescente entre os ganhos dos dirigentes de topo e os dos trabalhadores das respectivas empresas, apontando mais uma vez a necessidade de um sindicalismo actuante e da negociação colectiva para contrariar estes excessos.
Para corrigir e prevenir excessos remuneratórios de CEO e outros administradores advoga-se a transparência e a criação de mecanismos que permitam aos accionistas (mas não só os das Comissões de Remuneração e seus próximos) pronunciarem-se eficazmente.
Mas não basta. A equidade tem que ser de tal maneira respeitada que a empresa, através dos seus máximos responsáveis, se possa apresentar de cara lavada à sociedade. Se não for assim, como é possível que se fale de Responsabilidade Social da Empresa? Ou que se proclame o amor ao próximo como critério de gestão?
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