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02 outubro 2011

A Conferência, os media, o crédito, os bancos e a democracia

Estranha associação, esta! O que é que têm a ver a Conferência com o crédito e os media com os bancos? E todos eles com democracia? Parece que pouco têm a ver umas coisas com as outras e, no entanto, têm tudo.

Não há democracia sem informação transparente, do mesmo modo que não há eficiência económica e mercados perfeitos com reservas de informação. É a este propósito que, a seguir, abordo as relações da Conferência com os media e do crédito com os bancos.

Realizou-se no passado dia 30 de Setembro, nas instalações da Fundação Calouste Gulbenkian uma Conferência, em cuja convocação havia o propósito de demonstrar que a Economia Portuguesa é uma Economia com Futuro. O propósito foi alcançado. Para tal bastou chamar a atenção que era necessário olhar para o outro lado da montanha e começar a fazer o caminho.

Foi dado conhecimento da iniciativa aos media, quer antes, quer durante a Conferência.

Pela parte do público houve um número de inscrições, superiores a 500 e muitas outras pessoas participaram, mesmo sem inscrição. A reflexão e o debate que se desenvolveu durante todo o dia 30, teve a novidade, o rigor e a pontaria certeira, como há muito já não víamos entre nós.

Apesar da reconhecida valia da temática em discussão e do entusiasmo da participação, a quase totalidade dos media entenderam, escorados, certamente, em “critérios jornalísticos”, de que o facto não era suficientemente relevante para poder ser tido em conta, para dele dar conhecimento aos leitores, aos ouvintes e aos telespectadores.

Os “critérios jornalísticos” são, com frequência, invocados para justificar a não cobertura de factos considerados relevantes. São critérios que tem mais a ver com orientações das Direcções dos jornais do que com as livres opções dos jornalistas, não suportados por qualquer escrutínio democrático. Constituindo os media instrumentos relevantes de transmissão da informação, é inquestionável que a informação que por eles circula, e de que são meros instrumentos, é imprescindível à formação da consciência democrática dos cidadãos. A cidadania ao ver-se, assim, amputada de uma das suas componentes fundamentais fica mais pobre, senão mesmo inviabilizada.

Do mesmo modo que os media servem para fazer chegar a informação aos cidadãos, também os bancos têm como sua maior vocação proporcionar financiamento às famílias e às actividades produtivas. Mas o exercício dessa sua vocação é o que não temos visto acontecer nos últimos tempos. E todos se perguntarão, porque é que isso está a acontecer?

São muitos os factores explicativos mas há, pelo menos, dois que são centrais. O primeiro é o de que, a partir de certa altura, as aplicações financeiras, realizadas fora da economia real, começaram a tornar-se mais rentáveis do que as que poderiam realizar-se nesta última. Como os governos não querem, ou não têm sido capazes de regular os mercados financeiros, os bancos não fazem mais do que o que faria qualquer outra pessoa ou instituição movida pela preocupação da obtenção do máximo de rentabilidade: investem em produtos financeiros

O segundo é uma consequência das tropelias que desde há alguns anos têm sido praticadas pelas instituições financeiras em seu benefício ou em benefício do que consideram ser os seus melhores clientes. Como o fruto era, aparentemente, apetecido, foram-se correndo cada vez maiores riscos em aplicações que se revelaram estarem assentes em suportes virtuais e sem garantias sustentáveis.

Bastou que uma pequena areia para desequilibrar a estrutura que estava montada; para que a fantasia do dominó se começasse a desmoronar ( e aí está a crise que não é só local, mas global). Por isso, o dinheiro que hoje chega aos bancos tem como aplicação privilegiada tapar os buracos que entretanto foram descobertos e ficaram a descoberto.

Há cerca de um mês foi conhecido que se encontrava em Lisboa uma delegação da troika com vista a avaliar a robustez dos 50 melhores clientes de cada um dos principais bancos. Não se voltou a falar do assunto mas, certamente, que o exercício de avaliação já terminou. Pena é, que à semelhança do que tem sido revelado acerca de outras varáveis económicas, também aqui não tenha sido feita a publicitação dos resultados a que se chegou.

Com a estrutura bancária que temos não surpreende, por isso, que o financiamento não chegue ao (para o) sistema produtivo. E, no entanto, não há sistema democrático que subsista sem que o sistema produtivo seja permanentemente alimentado com sangue novo (financiamento).

Assim, do mesmo modo que os média funcionam como vasos indispensáveis de alimentação da cidadania e do sistema democrático, também os bancos constituem instrumento imprescindível de revivificação da economia real, sem a qual a democracia também pode ser posta em causa.

Uns e outros necessitam de regulação ou controle para que possamos continuar a aspirar a viver numa sociedade, mais solidária, mais justa, mais cidadã e mais democrática.

Temos, aqui, dois excelentes pontos de partida para a discussão dos fundamentos para a existência de bens e serviços públicos. O que é essencial para a sociedade não pode ser deixado, exclusivamente, à iniciativa privada. Dir-me-ão que que a concorrência induz a qualidade dos serviços. Respondo que o resultado está à vista e que muito gostaria eu de saber onde é que está essa invocada concorrência.

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