Não se trata de matéria despicienda, porque das várias alternativas resultam consequências diversas e gravosas, sobretudo para os que têm, sempre, beneficiado de rendimentos mais baixos sem poderem participar no banquete do “poder”.
Renegociações e reestruturações, de quê? Claro que, da dívida. Mas importa, apesar de a chamada de atenção já ter sido feita várias vezes, que o que está em causa não é, apenas a dívida pública mas, também, a dívida privada. Se outra razão não existisse há, pelo menos, a da forte interdependência entre uma e outra; tudo o que se fizer numa não deixa de ter consequências sobre a outra e vice-versa. E vale a pena recordar que a dívida privada representa mais de 80% do total da dívida.
Porquê as confusões? Vejamos o que se discute:
- Há quem não queira ouvir falar nem numa, nem noutra;
- Há quem considere que se pode admitir a possibilidade de renegociação, mas de reestruturação, nunca;
- Há quem diga que a reestruturação é inevitável e nem quer ouvir falar de renegociação.
Terá tudo isto algum sentido? O meu ponto de vista é o de que não.
Em relação à primeira alternativa, por falta de espaço aqui, apontarei uma saída no fim. As duas outras podem ser clarificadas em conjunto.
Tanto a renegociação, como a reestruturação devem ser entendidas como partes de um mesmo processo. A renegociação sublinha “os meios” utilizados; a reestruturação acentua os “resultados”.
O que é negociar a dívida? A negociação da dívida pode envolver as taxas de juro, os prazos de amortização e de pagamento dos juros e os próprios montantes. Mas será legítimo renegociar a dívida? Porque não?
Em abstracto a iniciativa da renegociação tanto pode pertencer aos credores, como aos devedores, mas uns e outros têm que estar de acordo em sentar-se à mesma mesa. Se, nas condições existentes, o reembolso da dívida se vier a torna problemática, então os credores preferem renegociar a ver o país entrar em “default”. A iniciativa pode ser dos devedores se, por ex. for considerado que as taxas de juro fixadas o foram em condições de mercado ilegítimas, como aconteceu recentemente, connosco, a propósito do comportamento das agências de “rating”.
A renegociação não deve ser encarada como uma catástrofe nacional, antes pode tomada como um purgante que permite recolocar os mecanismos de funcionamento da economia em condições de eficiência e de eficácia, isto é, de desenvolvimento.
E agora as reestruturações; quando delas se fala há quem pense que cai o Carmo e a Trindade. Certamente que os que têm esse receio estão a olhar, apenas, para uma das modalidades (rara) de reestruturação, como a que aconteceu na Argentina há alguns anos. Reestruturar significa mudar a estrutura. Ora, sempre que há renegociação e se chega a um qualquer resultado, há mudança da estrutura da dívida. Assim sendo porquê tanta aversão a que se fale de reestruturação? Não há nenhuma razão racional que o justifique.
Voltemos a quem não quer ouvir falar nem numa, nem noutra. Se vivêssemos no melhor dos mundos não seria difícil chamar mal comportado a quem tivesse a iniciativa da renegociação que, agora, podemos chamar reestruturação. Mas não vivemos no melhor dos mundos.
Pressupõe-se que com os dinheiros do “grande empréstimo”, apesar das dificuldades iniciais, vamos gerar crescimento e desenvolvimento capazes de aliviar aquelas dificuldades e gerar recursos para pagar a dívida. Só que o pressuposto, apesar da sua bondade, com o programa de austeridade que cá chegou, é tão certo como termos a certeza de que hoje acaba o mundo. Já não tenho espaço para enunciar as razões, mas a leitura da “Economia com Futuro” certamente que o permite melhor do que o que eu faria aqui.
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