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01 agosto 2017

Sem liberdade não há democracia. Mas sem equidade a democracia morre

A recente divulgação em Portugal da riqueza acumulada por um pequeno número de super-ricos (20 patrimónios individuais equivalentes a cerca de 10% do total do PIB nacional!) obriga a trazer para a opinião pública não só a discussão sobre a problemática inerente à constituição desses patrimónios como as consequências que advêm da grande desigualdade, que tal situação evidencia, para o bom funcionamento das sociedades, o seu desenvolvimento e democracia.

De momento, deixemos de lado a reflexão (também ela relevante e imperiosa!) acerca dos fundamentos que subjazem à constituição de tão gigantescas fortunas e sua concentração e destaquemos, neste post, o impacto da grande desigualdade sobre o desenvolvimento e a democracia.

Os dados agora publicitados vêm confirmar o que a análise empírica acerca da repartição do rendimento e da riqueza em Portugal vem revelando. Está publicado nas páginas deste blogue um texto de Carlos Farinha no qual se comprova que não só Portugal é um País muito desigual, como a desigualdade vem-se agravando desde 2009, com consequências muito negativas para a coesão social e para o próprio crescimento económico.

A este propósito vale a pena ter presente um artigo recente (20 Julho 2017) de Robert Reich intitulado How Inequality Erodes the Foundation of Modern Societies, no qual o Autor adverte para as ameaças a que, presentemente estão sujeitas as sociedades do mundo ocidental por via de descontentamento e desafiliação dos seus próprios cidadãos que se vêem excluídos ou marginalizados da actividade económica e desprovidos de meios de satisfação de necessidades básicas e qualidade de vida e assim perdem confiança nas instituições e em quem as dirige, com crescente propensão para os populismos de direita e de esquerda ou derivas autoritárias.

Reich é perentório quando afirma, logo no começo do seu artigo: The greatest threat to Western liberal democracies in the future is more likely to come from extreme inequality than from Islamic extremism. This is because inequality erodes two foundation stones of modern society — openness to new ideas and opportunities, and a conviction that all citizens are morally equal.

Ao contrário do que sucedeu nas três décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial em que o crescimento económico e o progresso das economias do mundo ocidental foram a par de melhorias sensíveis na qualidade de vida da generalidade dos cidadãos e de maior inclusão social, graças à implementação do estado social (educação, saúde, segurança social, emprego, habitação), nas últimas três décadas, foi crescendo o número de cidadãos que foram sendo excluídos por efeito das políticas neo-liberais que pretensamente se propunham favorecer a iniciativa e a criatividade nos negócios, mas esqueceram ou subestimaram a equidade na partilha do “bolo” e, assim, descuraram a sustentabilidade da democracia.

Se quisermos salvaguardar a democracia e promover o desenvolvimento temos de trazer, de novo, para o enfoque do debate político a prossecução do objectivo da contenção da desigualdade e da erradicação da pobreza, não só por razões de ordem ética, mas também por exigência de sustentabilidade do próprio modelo económico e, em simultâneo, da sustentabilidade da democracia.

Felizmente que, embora com fundamentos e interesses distintos, as elites políticas de direita e de esquerda começam a convergir nesta necessidade.

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