De acordo com o raciocínio atrás desenvolvido não é de
resgate que parece tratar-se quando os Fundos de Estabilidade financiam
operações no mercado da dívida. É verdade que a intervenção no mercado
secundário da dívida é um apoio ao Estados em causa, mas essas intervenções não
impõem nenhum plano de austeridade. Com efeito, se quem possui os títulos e
deles se quer libertar encontra com facilidade quem lhos compre, isso significa
que nesse mercado a taxa de juro em vez de aumentar, deve diminuir.
Pergunta-se: porque é que para a Grécia, Irlanda e Portugal é
distribuído um prato de lentilhas e para a Espanha e Itália frango da perna? É
o tamanho, é o tamanho, meus senhores! Não estou a falar, necessariamente de
tamanho físico ou geográfico. Poder-se-á, ainda argumentar que as situações não
são idênticas.
Argumento falso. Em Portugal, por ex., em 2011 o deficit
público foi estimado em 4,2 do PIB e a dívida pública em 107,8 %, também do
PIB. Em 2008 era de 71,6%, em 2009 de 83,1 e em 2010 de 93,3 %. Seria bom que
nos interrogássemos porque é que o crescimento da dívida se deve ao crescimento
dos juros que lhe estão associados e sobre as razões porque é que tal acontece.
Na União Monetária, quando a capacidade de reembolso da
dívida é posta em causa, faz toda a diferença, ser pequeno ou ser grande. É o
mesmo que quando estamos perante uma gangrena; o corpo todo estremece de modo
diferente consoante a perspetiva é cortar um dedo ou cortar a perna toda.
Não há dúvida de que a insolvência põe em causa os
fundamentos da existência da moeda única, mas é claro que essa situação é
diferente conforme se trata de um país grande ou pequeno. Evidentemente que ela não
deveria existir no seio de uma verdadeira União Monetária porque, se houvesse riscos
de acontecer, os países se deveriam socorrer uns aos outros, tal como se verifica com
as várias regiões de um país em que existem capacidades de solvabilidade
diferentes.
Como é que alguém poderá ter pensado que iria haver em
Espanha e na Itália, uma troika como
houve em Portugal? Tratar estes dois países, do mesmo modo que
se tratou dos três iniciais, lançaria o pânico no mercado financeiro, não do
lado dos investidores (porque esses arranjarão, sempre, como se tem visto,
maneira de garantir o seu), mas do lado de quem aí coloca dívida, ou pode vir a colocar, e não tem
possibilidade de com aqueles medir forças.
De algum modo este novo figurino já estava a ser prefigurado
com o anúncio do “resgate” aos bancos espanhóis. Não se foi diretamente à
dívida pública, foi-se aos bancos, em primeiro lugar, procurando, desse modo,
proteger a sustentabilidade do “Reino de Sua Majestade”, embora tendo como
garante o Estado. Trata-se, por isso, de dívida soberana, mas não foi anunciado nenhum programa de austeridade, talvez porque os bancos fazem parte
da família.
E não há outras soluções? Claro que há, mas para isso seria
necessário que se superasse a escassez de vistas dominante, revendo o Tratado
de Maastricht e tornando viável a intervenção do Banco Central Europeu no
mercado primário, comprando e vendendo dívida aos Estados, como em grande medida
acontecia com os Bancos Centrais de cada um dos países, antes de os Estados do
euro terem abdicado das suas competências monetárias a favor do Banco Central
Europeu. Deu-se com uma mão e, em retorno, não se obteve nada, nem com essa
mão, nem com a outra.
Não tenho dúvidas de que todas as emboscadas que o mercado
financeiro (atuando a uma escala planetária) tem vindo a preparar e a impor têm um objetivo principal: a destruição do
euro. Um euro forte e com autonomia, em relação ao dólar, é, certamente um
obstáculo ao devastador avanço dos vândalos.
Os países do euro que não perceberam isto (vide Alemanha) pensaram que estariam
imunes aos ataques e que sempre sobreviveriam. Passaram a ter dúvidas quando o mercado
financeiro bateu à porta da Espanha e da Itália. Veremos agora se saberão ser
suficientemente perspicazes para se protegerem da enxurrada, adotando e
reforçando medidas como as agora anunciadas. Têm, afinal que perceber que se houver
naufrágio, dos corpos só se aproveitarão os cadáveres e os deles também aí estarão
incluídos.
Face a este novo modelo de intervenção, resta, ainda saber
se as condições anteriormente impostas aos três países originais permanecerão
como estão, ou se continuaremos com a arrogância do “não precisamos de negociar
prazos, nem condições de reembolso dos empréstimos".
Finalmente, o título deste post. Naturalmente, que se estivermos perante uma bomba atómica o
futuro será um futuro de destruição. Se se tratar da cheia do Nilo, talvez
possamos esperar que quando as águas descerem encontremos elementos de
fertilização suficientes para que a esperança de que o desenvolvimento aconteça
possa ser uma realidade.
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