Há dois dias, tomou-se conhecimento de que, depois de consultas em Bruxelas com os seus parceiros europeus, o Primeiro-ministro grego, tendo regressado a Atenas, anunciou o seu propósito de submeter a referendo o conteúdo das conversações havidas.
O burburinho que, na Europa e no mundo, este anúncio causou e continua a causar faz pressupor que algo de grave se está a passar. O que será?
Num post anterior mostrava-se que a Europa não estava a seguir por bons caminhos e que, a continuar, assim, ia mirrar. O que eu não esperava é que os sinais de deterioração se viessem a manifestar tão depressa e revelando tão grande fragilidade. Vou procurar mostrar porquê.
Quem tem vindo a seguir os posts do “Areia dos Dias”recordar-se-á que, a propósito da deterioração da situação da Grécia, eu utilizei a imagem de um agricultor (a Grécia) que, depois de se ter tornado sócio de uma cooperativa (União Europeia) e aumentado o seu nível de produção, deu-se conta de que lhe estava a faltar a água (financiamento) de que tanto necessitava para que a produtividade do seu esforço não diminuísse.
O que é que se seguiu depois? O nosso agricultor foi conversar com os restantes associados (ou talvez com a Direcção) da cooperativa e estes propuseram ceder-lhe a água, desde que uma parte (há quem pense que é a quase totalidade) do valor das suas colheitas fosse utilizada para reembolsar as contrapartidas do negócio.
O agricultor regressou a casa e entendeu (e bem!) que, antes de tomar outras iniciativas, devia perguntar à família (realizar um referendo) se estavam de acordo com as propostas da Cooperativa. Aconteceu que este seu propósito foi conhecido pela Direcção da Cooperativa que ficou literalmente em polvorosa.
Imediatamente foram convocadas reuniões dos vários Órgãos Sociais da Cooperativa, porque se considerou que a circunstância de o agricultor ir falar com a família poria em causa a sua viabilidade.
Leram bem? Falar com a família põe em causa a viabilidade da Cooperativa! Deste episódio podem ser retiradas várias ilações:
1. Afinal, o nosso agricultor, que todos pensavam estar completamente à mercê das decisões da Direcção, foi capaz de, só pela revelação da sua intenção de falar com a família pôr, como se costuma dizer, a Direcção “em sentido”; ele descobriu que, afinal, tem, na Cooperativa, muito mais peso do que imaginava;
2. A Direcção da Cooperativa entende que as decisões aí tomadas não podem ser conversadas entre os sócios e as suas famílias;
3. A Direcção da Cooperativa revela, melhor que qualquer observador externo, que um simples espirro de um associado põe em causa a viabilidade da Cooperativa; isto significa que a robustez da Cooperativa é muito reduzida.
De facto, a Europa, como muito bem o vêm demonstrando estes recentes episódios, se não mudar de estratégia e de políticas, continuará a “mirrar” e, rapidamente, poderá chegar a uma situação em que já não tem recuperação possível. Alguns analistas entre os quais um Prémio Nobel da Economia, vaticinam que essa situação já foi atingida, ou está próximo de ser atingida, e que se torna urgente alterar as políticas que o Banco Central Europeu tem vindo a adoptar.
Quando os referendos assustam tanto os poderes instituídos é sinal que o povo, esse grande pagador, não tem o direito de opinar, porque se o fizer pode pôr em risco tudo o que foi congeminado entre os pares reinantes.
ResponderEliminarAlgo está podre no reino das democracias...
Talvez, mas não deduzamos daí que o que está podre é a democracia.
ResponderEliminarSe a democracia devesse ser substituída, as consequências seriam, certamente, mais graves do que aquelas que já hoje vivemos